segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Aos meus amigos...

CRÓNICA DE VINICIUS DE MORAIS

Aos meus amigos...

AMIGOS

Tenho amigos que não sabem o quanto são meus amigos.
Não percebem o amor que lhes devoto e a absoluta
necessidade que tenho deles.
A amizade é um sentimento mais nobre do que o amor,
eis que permite que o objeto dela se divida em outros afetos,
enquanto o amor tem intrínseco o ciúme, que não admite a
rivalidade.

E eu poderia suportar, embora não sem dor, que
tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se
morressem todos os meus amigos!

Até mesmo aqueles que não percebem o quanto são meus
amigos e o quanto minha vida depende de suas existências ...

A alguns deles não procuro, basta-me saber que eles existem.
Esta mera condição me encoraja a seguir em frente pela vida.

Mas, porque não os procuro com assiduidade, não
posso lhes dizer o quanto gosto deles. Eles não iriam acreditar.

Muitos deles estão lendo esta crônica e não sabem
que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos.

Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro,
embora não declare e não os procure.

E às vezes, quando os procuro, noto que eles não tem
noção de como me são necessários, de como são indispensáveis
ao meu equilíbrio vital, porque eles fazem parte do mundo que
eu, tremulamente, construí e se tornaram alicerces do meu
encanto pela vida.

Se um deles morrer, eu ficarei torto para um lado.
Se todos eles morrerem, eu desabo!
Por isso é que, sem que eles saibam, eu rezo pela vida deles.

E me envergonho, porque essa minha prece é, em
síntese, dirigida ao meu bem estar. Ela é, talvez, fruto do meu
egoísmo.

Por vezes, mergulho em pensamentos sobre alguns deles.
Quando viajo e fico diante de lugares maravilhosos,
cai-me alguma lágrima por não estarem junto de mim,

compartilhando daquele prazer ..

Se alguma coisa me consome e me envelhece é que a
roda furiosa da vida não me permite ter sempre ao meu lado,
morando comigo, andando comigo, falando comigo, vivendo
comigo, todos os meus amigos, e, principalmente os que só
desconfiam ou talvez nunca vão saber que são meus amigos!

A gente não faz amigos, reconhece-os.
(Vinícius de Moraes)

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